A Polícia Federal encerrou, nesta sexta-feira (1°), o inquérito do caso de exploração mineral pela petroquímica Braskem no solo de Maceió (AL). A investigação indiciou 20 pessoas relacionadas à empresa e a seus colaboradores, investigadas por crimes de extração de sal-gema, que teria comprometido o solo de cinco bairros de Maceió e levado 60 mil pessoas a abandonarem suas casas. O relatório final da investigação foi enviado à 2ª Vara Federal de Alagoas. A PF informou sobre os resultados à Comissão Parlamentar de Inquérito, no Congresso Nacional, que também investiga o caso.
Os indiciamentos foram definidos por ações relacionadas a crime ambiental, dano qualificado, documentação falsa e sonegação de informações, entre outras. Em dezembro de 2023, a PF deflagrou a Operação Lágrimas de Sal com vistas a robustecer o inquérito sobre a exploração de sal-gema em Maceió. Os agentes cumpriram 14 ordens de busca e apreensão em Maceió (11), no Rio de Janeiro (2) e em Aracaju (1). A sede da Braskem em Alagoas é um dos alvos das diligências.
Os indicados deverão responder por:
- crime ambiental que consiste em tornar uma área imprópria para a ocupação humana – Art. 54, §2º, inciso I, da Lei nº 9.605/98;
- crime contra o patrimônio a produção ou exploração de matéria-prima ou bens pertencentes à União sem autorização legal ou em desacordo com a autorização concedida. Art. 2º da Lei nº 8.176/91;
- dano qualificado o crime de destruição, inutilidade ou deterioração de patrimônio público: Art. 163, parágrafo único, inciso III, do Código Penal;
- apresentar um estudo ambiental falso, incompleto ou enganoso Art. 69-A, §2º, da Lei nº 9.605/98;
- crimes funcionais contra a Administração Ambiental – Art. 66 da Lei nº 9.605/98;
- funcionário público conceder licença, autorização ou permissão em desacordo com as normas ambientais – Art. 67 da Lei nº 9.605/98.
Em nota, a Braskem disse que ainda não analisou a íntegra do relatório da Polícia Federal. Veja o texto completo do posicionamento da empresa:
“A Braskem reitera seu compromisso com a sociedade alagoana, assim como o respeito e solidariedade para com os moradores afetados. A empresa ainda não analisou a íntegra do relatório policial e ressalta que, desde o início das apurações, contribuiu, assim como seus integrantes, com as informações e esclarecimentos ao seu alcance. A Braskem sempre atuou em conformidade com as leis e regulações do setor, informando e prestando contas regularmente às autoridades competentes. Expressamos nossa confiança nos integrantes mencionados no inquérito e seguiremos empenhados no cumprimento de todos os compromissos assumidos.”
Em dezembro, a Defesa Civil de Maceió informou que a mina n°18, operada pela mineradora, se rompeu, por volta das 13h15, na Lagoa Mundaú, localizada no bairro do Mutange. O colapso parcial abriu uma cratera com volume de água equivalente a 11 piscinas olímpicas. De acordo com informações do órgão, a mina 18 se encontra com 90% de sua capacidade preenchida; as outras 34 minas não teriam sido diretamente afetadas.
Em 2024, a CPI aprovou o relatório final do senador Rogério Carvalho (PT-SE), que pedia o indiciamento de três empresas e de 11 pessoas por crimes ambientais A Braskem e oito pessoas ligadas a ela foram apontados como responsáveis por crime contra a ordem econômica, previsto na Lei 8.176, de 1991, por explorar matéria-prima pertencente à União em desacordo com as obrigações impostas pela legislação.
De acordo com o relatório aprovado pela comissão, também foi infringida a Lei de Crimes Ambientais (Lei 9.605, de 1998), ao se causar poluição que resulta em danos à saúde humana ou que provoca destruição da flora e fauna. O crime com pena mais severa prevê reclusão de um a cinco anos, enquanto o mais brando é de detenção de um a seis meses ou multa. Entre os indiciados, estava Marcelo de Oliveira Cerqueira, diretor-executivo da Braskem desde 2013.
Impacto ambiental
Em recente estudo, realizado por docentes das universidades federais de Alagoas (UFAL), Pernambuco (UFPE), Piauí (UFPI) e Brasília (UnB), foi constatado que mais 34 bairros de Maceió foram afetados indiretamente pela mineração da empresa Novonor (Braskem/Triken/Salgema). O estudo analisa aspectos de vulnerabilidade estrutural, ambiental, social e econômica da circunvizinhança dos cinco bairros atingidos diretamente. Bebedouro, Bom Parto, Farol, Pinheiro e Mutange, este último, epicentro da tragédia, já não existe mais.
Os pesquisadores observaram as sequelas do desastre e pontuaram as vulnerabilidades de outros bairros, cuja população é obrigada a viver com o dilema de sair de suas casas ou permanecer em perigo de afundamento. São eles: Gruta de Lourdes, Ponta Grossa e Vergel do Lago. Estão vulneráveis à subsidência os bairros Antares, Feitosa, Fernão Velho, Riacho Doce, Rio Novo, Santa Amélia e Trapiche da Barra. Com vulnerabilidade moderada, a pesquisa aponta os bairros Clima Bom, Garça Torta, Ipioca, Pescaria, Pontal da Barra e Prado.
Já os bairros Barro Duro, Canaã, Chã de Bebedouro, Chã da Jaqueira, Cidade Universitária, Cruz das Almas, Jacarecica, Jacintinho, Jardim Petrópolis, Levada, Pitanguinha, Ponta da Terra, Santa Lúcia, Santo Amaro, Santos Dumont, São Jorge, Serraria e Tabuleiro do Martins são considerados de baixa vulnerabilidade. O estudo não conseguiu atribuir o nível de vulnerabilidade dos bairros Jaraguá, Pajuçara, Ponta Verde, Jatiúca e Mangabeiras, por isso ficaram fora da pesquisa.
Trata-se do maior desastre ambiental ocorrido em área urbana no Brasil, e talvez no mundo, como resultado do colapso de uma das minas de extração da sal-gema, onde mais de 14 mil imóveis foram fechados e cerca de 60 mil famílias se viram forçadas a abandonar suas casa. O processo de afundamento do solo e de abalos sísmicos começaram a ocorrer devido à criação de enormes minas, sob área determinada, após 40 anos de mineração, iniciada na década de 1970.