Uma incoerência gigantesca parece ter se instalado na pauta de defesa do meio ambiente no Brasil. Uma rodovia de quatro faixas está sendo construída em área protegida da floresta amazônica, para facilitar o tráfego de 50 mil pessoas, inclusive líderes mundiais, durante a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, a COP30. O desmatamento de dezenas de milhares de hectares iria de encontro ao papel que a floresta desempenha na preservação do equilíbrio ambiental e climático, proposto pelo encontro, que ocorrerá em novembro de 2025, na cidade de Belém do Pará.
As informações foram divulgadas pela BBC News Brasil, em 12 de março. São 13 km de floresta adentro até a capital paraense. O governo do estado denomina a rodovia de “sustentável”. No entanto, os impactos estão sendo questionados por moradores e ambientalistas. “Tudo foi destruído. Nossa colheita já foi derrubada. Não temos mais essa renda para sustentar a família”, disse Claudio Verequete à BBC, que sobrevive da coleta de açaí das árvores que existiam no local.
Para o governo do Pará é uma oportunidade de modernização e “intervenção importante de mobilidade”. Em entrevista ao portal de notícias, o secretário de infraestrutura, Adler Silveira, explicou que a rodovia faz parte de 30 projetos em andamento na cidade para “prepará-la” e “modernizá-la”, de forma a “deixar um legado para a população e, mais importante, atender bem às pessoas durante a COP30”. A rodovia já havia sido proposta desde 2012, mas não fora aprovada por questões ambientais.
“A obra da Avenida Liberdade não está derrubando a floresta, não envolve a retirada de moradores e não faz parte do pacote de investimentos federais e estaduais para a COP 30”. “A avenida é um projeto antigo e está sendo construída em uma área já antropizada, por onde passa um linhão de energia. O traçado segue justamente a faixa onde a vegetação foi anteriormente suprimida”. “A avenida de cerca de 13 km é uma importante obra de mobilidade para a Região Metropolitana de Belém, vai beneficiar mais de 2 milhões de pessoas”, disse trechos da nota divulgada pelo governo.
De acordo com a BBC, a via deixa duas áreas de floresta protegida desconectadas. Para a professora Silvia Sardinha, veterinária especializada em vida selvagem e pesquisadora em hospital universitário de animais, que reabilita animais silvestres feridos e devolve-os à natureza, “desde o momento do desmatamento, há uma perda. Vamos perder uma área para soltar esses animais de volta à natureza, o ambiente natural dessas espécies”, afirmou. “Animais terrestres não poderão mais atravessar para o outro lado também, reduzindo as áreas onde podem viver e se reproduzir”, reforçou.
O governo argumenta que estão sendo construídos corredores para a passagem de animais silvestres. “O Governo do Pará está implementando diversas soluções estratégicas para assegurar a sustentabilidade da via, incluindo a construção de ciclovias, a utilização de energia solar para sua iluminação e a implantação de 34 passagens de vida silvestre ao longo do percurso para permitir o livre tráfego da fauna local”, complementou em nota.