terça-feira, 23 de dezembro de 2025 – 16h53

Bois de Carnaval: manifestação genuína e infantil dos bairros do Poço e da Ponta da Terra

Folhetim
Guilherme e Keilla Calazans, nas brincadeiras do Boi de Carnaval - Foto: ArquivoPessoal

Chegou dezembro e toda lembrança vem do burburinho das festas da Praça Senhor do Bonfim, no bairro do Poço.

A procissão em meados de novembro já emendava com os festejos natalinos. O vai e vem das beatas indo pras missas que preparavam para o Natal. A garotada que ia desfrutar dos brinquedos montados na praça (barcos, patinhas, carrossel, pescaria, tiro ao alvo), e a moçada, que aproveitava pra paquerar nas apresentações do pastoril.

Lá se vai um tempo bom. Costumo dizer que gosto do Natal, pois o Carnaval está mais próximo. E, aqui, o nosso assunto é o carnaval, ou melhor, os “bois de carnaval”.

Quem queria montar o seu boi no carnaval, em dezembro já corria para reservar uma cabeça. Pedia, no açougue, que o dono conseguisse, no matadouro, a carcaça. Tinha de colocar para secar e usá-la no carnaval. Quem não fazia a secagem amargava o mau cheiro embaixo da armação. Quem tinha um vizinho habilidoso, como o Bertinho (Galberto Verçosa), podia contar com seus dotes na armação.

Tudo era muito simples. O lençol da cama da mãe ou vó servia para cobrir a estrutura que fazia o papel de corpo. Começava a busca por latas de manteiga, no armazém do seu João Ferreira, na venda do seu Severino, para fazer os tambores. Na Viação N. S. de Fátima, seu Quinca liberava câmara de ar, que não era mais usada nos pneus dos ônibus, para fazer o tampo dos tambores. Haja correria!

Boi de carnaval era uma manifestação popular que só existia nos bairros do Poço e da Ponta da Terra. O pessoal das ruas se juntava e montava seus bois, no Reginaldo, no Suvaco da Ovelha, na Praça da Maravilha, na Rua do Corredor, na Rua dos Coqueiros… era uma brincadeira especialmente formada por crianças.

Os adultos ajudavam na montagem. Bois montados, nos dias que antecedem o carnaval, saiam pelas ruas pedindo dinheiro para comprar os enfeites dos bois e comprar “confeito”.

Corri atrás dos bois de carnaval nos anos 1960 e 1970, e em meados dos anos 1990. Adulta, trabalhando e já mãe. Um dia, minhas colegas de trabalho chegaram contando do susto que tiveram ao serem abordadas, no sinal de transito do Riacho do Sapo, por uns “maloqueiros” com um boi pedindo dinheiro.

Ficaram aliviadas quando reconheceram que quem guiava o boi era meu filho Guilherme (com 7 ou 8 anos de idade). Por aqui, paixão pelo carnaval é coisa de família!

Depois de um tempo começaram a batizar os bois: Dragão, Escorpião, Paraná, Gato Guerreiro, Pacato. Quando apareciam, era um corre-corre para acompanhá-los, seguindo uma batida ritmada pelos tambores e o refrão “ê boi…ê boi”. Lá ia eu, tocando o meu tambor, seguindo junto com os brincantes.

Os garotos cresceram, e os bois ficaram mais caprichados. A brincadeira continuava na rua. No carnaval, veio o slogan “Maceió no carnaval é para descansar”. E os bois como iam sair nas ruas sem carnaval? Nosso grito “ê boi… ê boi” foi silenciado e criaram um festival, em local fechado.

Os primeiros aconteceram no SESC Poço. Virou coisa de adulto, disputa acirrada. Nos primeiros festivais, até bala saiu. Não podemos ignorar que ficou organizado, que virou show.  Não é mais no carnaval, nem tem a inocência de uma brincadeira infantil. É profissional, vale prêmio, status.

O improviso ficou de lado. Pra mim, perdeu a graça. Não é “boi de carnaval”, virou Bumba meu Boi, com enredo, figurantes e figurinos, numa data fora dos festejos de Momo, é claro!

É saudade… ê boi, ê boi…

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