Representante dos agricultores do Rio Grande do Sul fez um alerta sobre os problemas enfrentados na área rural gaúcha, após as chuvas que assolaram o estado em 2024. Cerca de 30 produtores teriam tirado a própria vida devido à falta de apoio efetivo, para resolução dos problemas financeiros e de produção agrícola. A ausência de respostas definitivas do governo federal teria levado os ruralistas a medidas extremas.
A coordenadora do movimento SOS Agro RS, Grazi Camargo, falou da tragédia no campo, ao programa Alive, apresentado pelo jornalista Claudio Dantas. O movimento surgiu em 2024 para contribuir, com entidades e sindicatos, no cuidado das dívidas dos agricultores e na cobrança de soluções efetivas do poder público. O SOS atende, por dia, a cerca de 50 produtores endividados.
“Os agricultores do Rio Grande do Sul, após as enchentes do ano passado, estão vivenciando um cenário terrível. As dívidas estão muito agravadas. Todos nós perdemos muita produção, especialmente de soja. O pessoal do Vale do Taquari perdeu território, terra, animais e propriedades. Neste ano, veio uma seca. Mais uma frustração de safra”, disse Camargo, ao recordar como se deu o processo de endividamento dos produtores rurais.
A coordenadora alerta para os suicídios que vêm ocorrendo entre os agricultores desde o ano passado. “Em julho [de 2024], teve o primeiro suicídio, cometido por uma agricultora que perdeu todos os seus animais. Ela era uma produtora de leite e não enxergou saída. Não percebeu que poderia, de alguma forma, buscar ajuda para renegociar as dívidas. Começou esse cenário caótico que a gente vive até hoje”, lamentou.
17 meses pedindo socorro ao governo federal
Camargo afirma que o SOS Agro RS está em contato com governo federal, Ministério da Fazenda e Ministério da Agricultura há mais de 17 meses. “Já faz mais de 17 meses que a gente pede socorro ao governo federal. Até hoje, não foi feita uma solução realmente definitiva, para que a gente consiga continuar na atividade e alongar todas essas dívidas. Muitos produtores estão completamente abandonados e não percebem como conseguir ajuda”, esclareceu.
O que chegaria aos agricultores seriam soluções paliativas. A renegociação de dívidas, proposta pelo governo federal, agravaria o endividamento. “Nada de definitivo foi feito. Porque, na verdade, o que eles mandam para os produtores são soluções paliativas e não definitivas. O produtor pode prorrogar suas dívidas por três, quatro anos, mas os juros, que vêm nessa renegociação, acabam dobrando, triplicando a dívida. Aí é que o produtor se desespera”, revelou.
Segundo a coordenadora, o aporte federal não foi suficiente. “Desde o ano passado, especificamente para a agricultura, o governo federal mandou R$ 5,8 bilhões, de uma demanda de R$ 100 bilhões. Nós precisaríamos de R$ 100 bilhões para recompor o setor, falando de dívidas em instituições financeiras e dívidas fora delas, com fornecedores de insumos, cooperativas e cerealistas”, relatou.
“Agora, na Expointer, no dia 5 de setembro, os ministros da Agricultura e do MDA [Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar], anunciaram uma Medida Provisória no valor de R$ 12 bilhões para renegociação de dívidas, não somente para os agricultores do Rio Grande do Sul, mas para todos os agricultores do Brasil”, recordou.
“Dentro deste estudo, mais ou menos 60 mil produtores do Rio Grande do Sul poderiam renegociar suas dívidas. Até hoje, nenhum produtor conseguiu renegociar dívida alguma pela MP”, informou.
Medidas paliativas do governo estadual não resolvem problema
O governo do Rio Grande do Sul pediu ao banco do estado, o Banrisul, que não negativasse os produtores, colocando-os em protesto. A resolução duraria 90 dias. “Era pra gente tentar aguardar as medidas, as MPs, que estavam vindo na demanda federal. Após isso, fez um aporte de R$ 150 milhões, dentro do Banrisul, para dar um fôlego para que alguns produtores renegociar suas dívidas”, contou.
A renegociação de dívidas agravaria o endividamento rural e não permitiria novos investimentos. “Todas as vezes que o produtor renegocia dívida a capacidade de pagamento dele diminui. Ele tem um alto risco, está completamente comprometido com dívidas, e não consegue pegar recursos novos para fazer uma nova safra”, argumentou.
30% dos produtores vão parar de produzir
Cerca de 30% dos produtores gaúchos podem parar de produzir. “Toda essa problemática, em vez de ser resolvida, está sendo empurrada com a barriga. Isso está fazendo com que muitos produtores não fiquem mais na sua propriedade. Nós temos hoje, em torno de 30% dos agricultores, vão para de produzir. Eles não têm mais capacidade financeira para isso”, destacou.
As dívidas atingem a produção agrícola de pequena, média e grande escala. “Nós hoje temos produtores de agricultura familiar aos grandes produtores que não têm condições de fazer a nova planta que já se iniciou no Rio Grande do Sul. O produtor não tem dinheiro para o óleo diesel, não tem dinheiro para comprar os insumos necessários para dessecação, para fazer dinheiro tratamento das sementes, não tem fertilizantes”, afirmou.
‘Produtor não suporta mais’
“Já tem produtores que nos ligam desesperados que não têm dinheiro para comer. Só têm mais dois meses de alimentação das vacas, dos animais. Aqui, o cenário é muito pior do que qualquer pessoa possa imaginar. O produtor foi indo até onde ele realmente aguentava. E, agora, ele não suportava mais”, ressaltou a coordenadora.